O filme A Melhor Mãe do Mundo, de Anna Muylaert, recebeu o prêmio de Melhor Filme no Festival do Audiovisual Cine PE. O resultado foi anunciado nesse domingo (15/6), último dia do evento. O filme conta com Shirley Cruz e Seu Jorge como protagonistas e tem estreia nos cinemas marcada para o dia 7 de agosto.
A produção de Muylaert concorreu na Mostra Competitiva e foi exibido na primeira noite do festival. A disputa contou com O Ano em que o Frevo Não Foi pra Rua, de Mariana Soares e Bruno Mazzoco; Senhoritas, de Mykaela Plotkin; Itatira, de André Luís Garcia; e Nem Toda História de Amor Acaba em Morte, de Bruno Costa.
O evento contou com a exibição de 38 filmes, em sessões gratuitas, no Teatro do Parque e no Cinema São Luiz.
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A Melhor Mãe do Mundo
Enquanto a maior parte das narrativas sobre abuso doméstico começam com a parte do “felizes pra sempre”, o novo filme da diretora Anna Muylaert se inicia em uma delegacia, onde Gal (Shirley Cruz) tenta denunciar o marido. Se a burocracia deturpada impede que ela consiga proteção para si mesma, essa cena inicial estabelece o furacão que será a interpretação de Shirley Cruz no papel de uma mãe disposta a tudo para proteger seus filhos.
Se até hoje a discussão em torno da vivência abusiva busca certa culpabilidade, ou mesmo cumplicidade em parte da vítima, Muylaert consegue, na metáfora central, ilustrar algumas das razões pelas quais o laço matrimonial é difícil de se romper. A fuga de Gal envolve o desabrigo, a troca de um lar pelas ruas de São Paulo, com duas crianças pequenas, vividas por Rihanna Barbosa e Benin Ayo.
Gal vive à beira do abismo social, empurrando sua carroça, dia a dia, catando recicláveis para a revenda. Mulher negra e casada com Leandro (Seu Jorge), ela vive o drama de simplesmente não ter para onde ir.
Assista ao trailer de A Melhor Mãe do Mundo:
Indo morar na rua, fugida, Gal tenta mascarar a verdade para os filhos, fingindo que tudo é uma grande aventura. Assim, a metáfora cresce, com a imagem de ela empurrando a carroça enorme, com duas crianças. A mãe literalmente carrega nas costas o mundo inteiro dela. É a perfeita amarração entre o visual e o temático, construído por diretora e atriz. Se Ulisses deixa mulher e filho em casa para ir viver sua odisseia, para a mulher, isso é impossível.
Uma narrativa bem desenhada como essa não deixa de apresentar riscos. A máscara aventuresca convida à reflexão de que o filme nunca apresenta, de fato, os riscos reais de se viver em situação de rua. Afinal, convenhamos que, se algo profundamente terrível acontecesse com essas crianças, o filme se tornaria insuportável.
Só que Muylaert também busca outra temática ao considerar as ocupações urbanas, em que pessoas povoam e habitam os edifícios abandonados de grandes cidades, introduzidos pela personagem Munda (Rejane Faria – como sempre, ótima). É uma possibilidade de nova vida.
A história também se interessa em apresentar o perigo constante daquele que Gal abandonou. Afinal, se o filme tem Seu Jorge no elenco, não o deixará de fora. A construção de sua presença na trama, após a fuga, é feita de maneira interessante, de forma a denunciar como todo o ecossistema de um relacionamento abusivo se organiza para a conformidade, por meio de amigos e parentes. A entrada de Leandro e seu arco individual provocaram calafrios no público dentro da sala de cinema. É em uma cena de churrasco de família que o filme ganha seus toques de terror, aonde vemos todo o universo de agressão masculina que Muylaert e seus atores criaram. As marcas da violência permeiam todos os relacionamentos ali presentes.
A Melhor Mãe do Mundo é aquela que deseja um futuro melhor. Se o futuro de Gal e seus filhos é incerto, ela, pelo menos, tentará fazer dele algo que merece ser vivido.