Cada passo, minuto de estudo ou brincadeira de Rafael Torelly (foto em destaque), de 10 anos, precisa ser monitorado. O menino tem diabetes mellitus tipo 1 (DM1), condição autoimune sem cura que impede a produção de insulina pelo pâncreas. O garoto precisa verificar constantemente a glicose e fazer aplicação do hormônio para evitar picos prolongados de açúcar no sangue. Caso o contrário, o pequeno pode até mesmo morrer.
Veja:






Famílias lutam pela derrubada do veto de Lula ao projeto que reconhece diabetes tipo 1 como deficiência
BRENO ESAKI/METRÓPOLES @BrenoEsakiFoto
O presidente Lula vetou um projeto de lei que reconhecia a diabetes como deficiência
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Rafael tem diabetes tipo 1 e precisa de monitoramento constante inclusive de aparelhos
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Pacientes com DM1 precisam monitorar constantemente a glicose no sangue
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Pacientes precisam receber constantemente insulina
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Ária recebeu o diagnóstico de DM1 durante uma viagem
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A pequena precisou ficar interna na UTI
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Ária sonha em ser médica no futuro
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A família de Ária monitora a glicemia da menina constantemente
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Para as famílias de pessoas com DM1, o veto foi um erro do governo federal
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O reconhecimento como PCD acarreta em uma série de benefícios para os pacientes
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O menino não está só. Segundo o Instituto Diabetes Brasil, com base em estudo da revista Lancet, o Brasil tem 520 mil pessoas com DM1. No Distrito Federal, 10 mil têm o diagnóstico, de acordo com dados da Secretaria de Saúde. O Congresso Nacional aprovou um projeto de lei para classificar a condição como uma deficiência. No entanto, o texto acabou vetado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Agora, famílias de pacientes lutam pela derrubada do veto.
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Rafael recebeu o diagnóstico logo após comemorar o primeiro aniversário. Com 12 meses de vida, sofreu cetoacidose diabética (CAD). Trata-se de uma complicação gravíssima em que o sangue fica com muito açúcar e passa à condição de ácido. O bebê ficou cinco dias na unidade de terapia intensiva (UTI). “É devastador. Receber o diagnóstico crônico do seu filho é duro”, afirmou a mãe do menino, a servidora pública e nutricionista Ana Carolina Torelly, 47.
O diagnóstico transformou a vida da família. Além da mudança da alimentação e no estilo de vida, o monitoramento constante de Rafael passou a ser rotina. Rafael usa um Sistema de Infusão Contínua de Insulina. O equipamento custa aproximadamente R$ 20 mil, com gasto mensal R$ 3,6 mil. Por mês, a família precisa de R$ 300 com insulina.
Médica
As complicações de DM1 são silenciosas. Em 2019, a pequena Ária Ohashi estava feliz e eufórica com uma viagem de avião para Minas Gerais em familía. A menina começou a ficar ofegante. Logo após o desembarque, foi direto para a emergência de um hospital. Recebeu diagnóstico de diabetes tipo 1. Os médicos identificaram uma quadro grave de CAD. A criança ficou 9 dias na UTI. Hoje, vive sob monitoramento.
“Qualquer atividade que ela vá fazer é preciso uma tomada de decisões para evitar um pico de glicemia ou uma queda. No curto prazo, uma hipoglicemia pode levar à morte. No longo prazo, uma glicemia alta pode trazer complicações de saúde, seja uma amputação, um problema no coração, cegueira ou problema renal. Na nossa família, tudo gira em torno da diabetes”, disse a bancária Cristina Ohashi, 44, mãe de Ária.
Equivoco
A corretora Juliana Monteiro de Barros, 46 anos, acompanha e apoia o marido e servidor Hélio Monteiro de Barros Júnior, 55, e a filha do casal, a estudante Luisa Monteiro de Barros, 22, ambos diagnosticados com DM1. Para Juliana, o veto do Planalto foi um equivoco. “É um problema de saúde grave. O projeto foi aprovado por unanimidade pela Câmara e pelo Senado”, argumentou.
“Com 48 anos, por ser diabético tipo 1, meu marido preciso fazer uma cirurgia de peito aberto e colocar três pontes de safena no coração. O DM1 tem artérias muito frágeis, muito finas”, comentou. Segundo Juliana, todas as complicações que uma pessoa pode ter a partir dos 60 anos, o diabético passa a sofrer a partir dos 30. Os pacientes tendem a ter outras condições autoimunes, como hipotireoidismo.
Além disso, pacientes encontram dificuldade para serem aceitos por planos de saúde, geralmente com necessidade carência por dois anos. “Não consigo fazer seguro de vida para o meu marido. A pessoa não pode pensar no futuro. É como se o diabético não tivesse futuro”, resumiu.
Enem
Segundo a presidente do Instituto Diabetes Brasil, Jaqueline de Jesus, 36, o reconhecimento do DM1 como deficiência já é uma realidade em diversos países como Canadá, Espanha. “Essas pessoas têm diversas barreiras na vida, como a inclusão na escola e mercado de trabalho. As crianças são impedidas de fazer matrículas nas escolas. Um estudante foi desclassificado Exame Nacional do Ensino (Enem) depois que o glicosímetro apitou”, detalhou
“O diabetes tipo é uma condição invisível. Hoje o Brasil é o terceiro país onde mais pessoas morrem por hipoglicemia. Os estudos da Lancet apontam que, no país, 250 mil pessoas morreram por conta dessa condição.
De acordo com o estudo da Lancet, no Brasil, uma criança de 10 anos típica tem, em média, 77 anos de vida saudável. Se desenvolver diabetes tipo 1, perderá, em média, 34 anos. No Canadá e EUA, onde a condição é reconhecida como deficiência, uma criança de 10 anos típica tem, em média, 83 anos e 80 anos de vida saudável, respectivamente. Crianças canadenses com diagnóstico de DM1 perdem 24 anos. Já as norte-americanas sofrem a perda de 22 anos.
Segundo o instituto, o reconhecimento da condição de pessoa com deficiência (PCD) causará um impacto orçamentário de R$ 489 milhões por ano. A informação foi apresentada antes do veto. O orçamento da União para 2025 é de R$ 5,8 trilhões. Jaqueline ressaltou que o monitoramento tem que ser constante. O paciente que não tem um equipamento para aferição continua precisa furar o dedo regularmente para medir a glicose.
Prós e contras
Pelo diagnóstico do médico endocrinologista, ex-presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia DF (SBEMDF), pesquisador do Centro de Pesquisa Clínica do Brasil (CPCB), João Lindolfo Borges, o reconhecimento de pessoas com DM1 como PCDs tem prós e contras. Por um lado, há facilidade no acesso a direitos e benefícios, por outro, há risco de aumento de estigmatização e preconceito.
Confira:


Arte/Metrópoles
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Outro lado
O Metrópoles entrou em contato com a Presidência da Republica, o Ministério da Saúde e o Ministério da Fazenda. O espaço segue aberto para eventuais manifestações.