A Confederação Nacional de Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais (Conafer), uma das entidades investigadas por fraudes no Instituto Nacional de Seguro Social (INSS), lançou uma ofensiva nas redes sociais depois da deflagração da operação Sem Desconto pela Polícia Federal (PF), no último dia 23.
Além do engajamento em publicações, a entidade também pediu para que funcionários gravassem vídeo com o mote “Eu sou Conafer” (foto em destaque).
Mensagens obtidas pela coluna mostram uma investida da cúpula da entidade para divulgar a atuação e engajamento de funcionários. Segundo um ex-funcionário ouvido pela coluna, o objetivo era mostrar que a Conafer existe e que possui associados.
A operação Sem Desconto mira entidades que forjavam a existência de associados e autorização para descontos na folha de pagamentos de aposentados e pensionistas.
O escândalo do INSS foi revelado pelo Metrópoles em uma série de reportagens publicadas a partir de dezembro de 2023. Três meses depois, o portal mostrou que a arrecadação de 29 entidades com descontos de mensalidade de aposentados havia disparado, chegando a R$ 2 bilhões em um ano, enquanto elas respondiam a milhares de processos por fraude nas filiações de segurados.
As reportagens do Metrópoles levaram à abertura de inquérito pela PF e abasteceram as apurações da Controladoria-Geral da União (CGU). Ao todo, 38 matérias do portal foram listadas pela PF na representação que deu origem à Operação Sem Desconto, deflagrada no dia 23/4 e que culminou nas demissões do presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, e do ministro da Previdência, Carlos Lupi.
Em 24 de abril, dia seguinte à operação, a movimentação por publicações começa em um dos grupo do WhatsApp da Conafer. “Solicitamos que todos os colaboradores postem esse card com urgência”, diz trecho da mensagem.
O card trazia um texto exaltando o trabalho da entidade, dizendo que a Conafer seria uma “alma coletiva de milhões de brasileiros que vivem da terra. É a esperança dos invisíveis. É a mão estendida aos que nunca tiveram voz”.
A movimentação para que funcionários gravassem os vídeos começou logo depois da operação da PF. Os vídeos passaram a ser publicados nas redes sociais no dia 24, e seguem sendo divulgados até agora. São dezenas de post em que se vê na capa o “slogan” da campanha emplacada pela entidade.
Uma das mensagens enviada em um grupo diz: “Quem ainda não gravou vídeo com a hashtag #EUSOUCONAFER, precisa enviar ainda HOJE”.
Em outra mensagem, é avisado em um grupo que os vídeos precisariam ser gravados por cada colaborador, não apenas gestores. “Solicito que mobilizem a equipe e encaminhem os vídeos com máxima urgência”.
Também foram compartilhados diversos “stickers” no WhatsApp com a #EUSOUCONAFER.
Em 29 de abril, dias depois do início da operação Sem Desconto, a entidade publicou em seu site que recebeu mais de mil vídeos e cartas de todo o Brasil em apoio ao trabalho da entidade.
“Em um cenário de dificuldades permanentes enfrentadas pelas famílias produtoras rurais, os programas e serviços da Conafer fazem uma grande diferença no campo. Foi esta a resposta obtida em menos de um dia de veiculação da campanha “EU SOU CONAFER”, com manifestações de todos os rincões, de Norte a Sul do Brasil, apoiando as ações e serviços da Confederação”, afirma o texto.
As publicações na redes englobam tanto funcionários de diversos setores – como tesouraria, diretoria de políticas públicas, recursos humanos e fotografia -, mas também pessoas que têm ligação com a entidade por meio de projetos promovidos pela Conafer.
Em uma das publicações, Fernanda Rettore, diretora de produção literária, diz que “em tempos difíceis, a verdade precisa ser reafirmada com ainda mais força, ainda mais mais coragem”. Segundo ela, a Conafer é feita por centenas de milhares de almas apaixonadas pela causa defendida pela entidade.
Os vídeos seguem sendo publicados pela Conafer. Somente na terça-feira (6/5), foram 19 posts no Instagram com os vídeos da campanha.

Sem Desconto
Como mostrou a coluna, a Confederação aumentou o valor descontado de aposentados em 57.000%, entre 2019 e 2023, segundo a Controladoria-Geral da União (CGU).
O valor arrecadado pela entidade saiu de R$ 350 mil para R$ 202 milhões.
Como mostrou a coluna, a Polícia Federal aponta em documentos da operação Sem Desconto que um assessor do presidente da Conafer é um dos operadores do esquema investigado por fazer a intermediação entre entidades e servidores do INSS.
Cícero Marcelino, apontado pela PF como assessor do presidente da Conafer, é sócio do banco digital Terra Bank, que tinha acordos com a entidade.



Defesa
A coluna entrou em contato com a Conafer e com a defesa do presidente da entidade, Carlos Lopes, mas não obteve resposta.
Anteriormente, a Conafer havia enviado uma nota à coluna afirmando que a entidade está contratando uma auditoria completa nos seus sistemas de pagamentos e financeiros para poder atender e esclarecer todas as eventuais dúvidas trazidas neste inquérito.
“Os vários anos de atividades da Conafer demonstram os inúmeros e bons serviços prestados aos seus associados, sendo que todos os questionamentos provenientes das autoridades constituídas serão objeto de diligências internas, hábeis a esclarecer todos os fatos, inclusive os que dizem respeito aos seus colaboradores, direção e também de terceiros”, dizia trecho da nota.
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