Se o já clássico O Lobo Atrás da Porta dramatizou um dos mais infames casos policiais do Rio de Janeiro, o Caso da Fera da Penha, novo filme do diretor Fernando Coimbra, traz forte inspiração do mais influente dos dramatistas ocidentias, William Shakespeare.
Misturando traços de Hamlet e, principalmente, Macbeth, a nova história é ambientada na disputa do poder pelo jogo do bicho carioca. Trata-se de um prato cheio para Irandhir Santos e Leandra Leal, que interpretam um casal da elite do jogo do bicho no meio de uma reforma em casa.
Valério (Santos) passou a vida tentando se distanciar da contravenção, mas a morte do pai e a subsequente suspeita de que o assassino foi o tio Linduarte (Stepan Nercessian), como em Hamlet, o trouxe de volta para o Rio de Janeiro.
Quando este se mete em apuros, Regina (Leal), esposa de Valério, vê uma oportunidade: matando o tio, Valério conseguirá se vingar da morte do pai e tomar posse do controle dos negócios. Juntos, executam o plano e logo tudo começa a dar errado.
O roteiro fornece um prato cheiro aos atores e diretor, especialmente ao tentar misturar em uma linha fina momentos de comédia com outros de drama intenso. É também o que deixa o filme mais arriscado, como em outro longo trecho, em um estaleiro, inspirado por ainda outra obra de Shakespeare, Titus Andronicus.
O casal que, no começo, pensamos ser divertido, atrapalhado, envolvido em uma comédia de erros carioca, se aprofunda tanto em complicações que um imenso buraco negro começa a tomar conta da trama.
O que está sempre em evidência é o primor técnico da direção, encenando momentos em planos sequência bem planejados e cronometrados, permitindo aos atores a permanência em estados plenos de atuação, utilizando corpos e palavras de maneira precisa e contundente.
As cartas de tarô que aparecem sempre nos remetem de volta ao título que logo aprendemos ser referência ao casal de protagonistas. Se a história começa divertida, o nó em volta de seus pescoços vai sempre se apertando.