O integrante do Primeiro Comando da Capital (PCC) que tentou assediar um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) é Rodrigo Felício (foto abaixo), conhecido como Tiquinho.
Mensagens e cartas mostram que familiares do faccionado tentaram falar com Kassio Nunes Marques, segundo investigação do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público de São Paulo (MPSP).
Veja conversas entre a companheira e a filha de Tiquinho do PCC:


O que se sabe até agora:
- A coluna Na Mira apurou que mensageiros teriam voado até Brasília para pleitear reuniões com o membro da mais alta Corte do país.
- Tiquinho driblou a proteção da Penitenciária de Segurança Máxima Presidente Venceslau II, no interior paulista.
- O faccionado conseguia enviar cartas escritas à mão que ultrapassavam os muros da cadeia e chegavam aos comparsas nas ruas.
- O envio da correspondência contava com a ajuda da mulher de Tiquinho, usada como “pombo-correio” durante as visitas.
- O faccionado orientava a filha sobre como deveria conversar com o ministro Nunes Marques.
- A jovem disse que participou de um jantar em uma embaixada e que os amigos do namorado podem ajudar no acesso ao ministro.
- Ela disse que um “amigo” ficou de marcar uma reunião com Kassio e que daria “resposta” no dia seguinte, pois a pessoa falaria com um “contato” dentro do Supremo, às 14h, e traria uma resposta.
- Em uma segunda conversa, a jovem solicita que a companheira de Tiquinho avise a ele que enviaria um telegrama codificado.
- Após a visita em Presidente Venceslau, já com as orientações do faccionado, a filha e a companheira voltam a conversar sobre a investida ao ministro.
- “Seu pai [Tiquinho] disse que não precisa de advogado, caso ela consiga a reunião com Kassio Nunes, pois o processo já vai estar nas mãos dele, e ele sabe o que precisa fazer”, diz a companheira, reproduzindo o recado do membro do PCC.
- Em novo diálogo, a filha afirma ter enviado um telegrama ao pai explicando que estão com dificuldades de marcar a reunião e de realizar o contato com uma pessoa de extrema confiança no STF.
- “Chegaram até a conseguir uma reunião com uma pessoa que trabalhou diretamente com o ministro, contudo perceberam que esse contato não renderia o resultado pretendido”, diz o trecho da conversa extraída na investigação do Gaeco.
O que diz o ministro
Acionado pela reportagem, o gabinete do ministro Kassio Nunes Marques informou ter identificado oito ações em nome da parte Rodrigo Felício. Entre elas, seis tiveram decisões do ministro desfavoráveis a Tiquinho, as quais foram confirmadas pela Segunda Turma.
Nas outras duas, houve pedido de Rodrigo Felício para que os processos fossem redistribuídos ao ministro Edson Fachin, e os autos foram encaminhados para a presidência analisar eventual prevenção.
“O ministro Nunes Marques não conhece as pessoas mencionadas e nunca as recebeu. Um advogado da parte (Tiquinho) pediu audiência pelos meios oficiais e foi atendido por um juiz instrutor do gabinete de Nunes Marques, como de praxe. A audiência foi por videoconferência”, informou o STF, em nota.
A audiência foi pedida ao gabinete do ministro por meio do advogado Aury Lopes Jr., que atua no caso de Rodrigo Felício em ação que tramita na Corte, sob relatoria de Nunes Marques. Essas audiências são de praxe para ouvir argumentos da defesa.
Logística milionária
Nos próximos dias, a coluna publicará nova reportagem destrinchando a investigação do Gaeco que revela o teor das cartas enviadas e recebidas por Tiquinho, mesmo atrás das grades.
Os manuscritos escritos com caneta esferográfica são recheados de determinações sobre a logística do tráfico internacional de drogas, principalmente envolvendo a compra e venda de maconha e cocaína.
Tiquinho fala com os comparsas, por exemplo, de decisões tomadas pelo “setor de inteligência” criado pelo PCC. O grupo funciona como uma ampla rede de criminosos.
As grades e os muros de prisões ao redor do país não são suficientes para brecar o fluxo de informações que movimentam as engrenagens da chamada sintonia restrita – o atual cérebro da facção.